Reflexões eleitorais

Mais de duas semanas depois das eleições, acho que já tenho condições psicológicas para dizer duas ou três coisas sobre o assunto:

1. Afinal onde anda o povo de esquerda? Num quadro de condições económicas deterioradas e de imperialismo económico anunciado – a troika pode ser vista de muitas maneiras, mas também desta! – era de esperar que o país inclinasse para a esquerda. Como reacção ao que já conhece, mas também como acto de defesa em relação ao que se anuncia. Esse era aliás o pressuposto por causa do qual nunca acreditei numa maioria de direita. Mas a realidade desmentiu totalmente esse pressuposto. Se o resultado do PS foi aquele que se esperava, nem mais nem menos, o PSD (e mesmo o CDS) tiveram resultados inesperados, acredito,  até para os próprios.  O CDS está no patamar superior do seu eleitorado natural (entre 5 e 15%) e o PSD chegou a um bom resultado depois de uma primeira metade de campanha carregada de gaffes e indecisões (a este título, é curioso notar que a inversão se deu após o debate com Sócrates, o que – mais do que da importência dos debates – nos dá uma medida da importância da gestão das expectativas no combate político). O BE regrediu com estrondo, o PCP manteve-se estagnado e os pequenos partidos de esquerda não canalizaram o voto de protesto de uma maioria de desiludidos (em parte só o partido dos animais o conseguiu fazer). Ou seja, a esquerda, facto insólito e raro em Portugal, ficou em minoria.

2. O que aconteceu ao Bloco de Esquerda? É natural de esteja tudo ao soco dentro do BE. Afinal parece óbvio que o partido é responsável não só pelo seu súbito emagrecimento, como até pela subida ao poder de uma maioria de direita em Portugal. Dois grandes erros são apontados ao BE, um táctico e outro estratégico. O erro táctico foi a apresentação de uma moção de censura ao governo. Esse era um ónus que, na melhor das hipóteses, devia ter sido deixado ao PSD, e, na pior da hipóteses, devia ter sido activamente bloqueado pelo próprio BE caso percebesse – como parecia óbvio – que uma queda do governo, naquelas condições e com um presidente de direita, conduziria inevitavelmente a uma vitória do PSD em eleições. Ou seja: devia ter sido a direita e não a esquerda a despoletar a crise política. O erro estratégico do BE foi o de nunca ter assumido perfil de governo. Foi isto que verdadeiramente o povo português não lhe perdoou. O BE foi inconsequente e deixou que essa inconsequência lhe fosse apontada durante demasiado tempo. Uma coisa é ser inconsequente com 4 ou 5% dos votos. Outra coisa é sê-lo com 10%. Porque 10% já servem para fazer uma maioria. Mas, na verdade – e espero que isto contribua para arrefecer as pulsões fratricidas dentro do BE… – qual era a alternativa? Poderia o BE sequer ponderar viabilizar um governo de Sócrates (não por causa de Sócrates, mas por causa das políticas de Sócrates)? Claro que não podia! Às vezes esquecemos-nos que são precisos dois para dançar o tango (para usar uma expressão famosa…).  E a deriva direitista de Sócrates foi, ao longo destes 6 anos, de tal ordem que na verdade não havia pontes possíveis entre a margem direita do bloco e a margem esquerda do PS. Tão simples como isso. Se isso vai mudar agora? Claro que vai. Talvez do lado do PS, talvez do lado do BE, ou, mais provavelmente, do lado de ambos.

3. Mas, afinal, porque é que Passos Coelho ganhou as eleições? Esta é a grande incógnita sobre a qual – acredito – até dentro da equipa de Passos Coelho alguém mais lúcido estará a meditar. Ao longo da nossa história recente temos tido muitos líderes cujo poder lhes caiu no colo e poucos que o tenham conquistado. Passos Coelho é apenas mais um. Mas há aqui algo de diferente, embora ainda não suficientemente definido: a viragem à direita. Há muito tempo que fazia falta, em Portugal, um grande partido liberal. Eu já escrevi aqui sobre isso por várias vezes, como aqui e aqui. Será o PSD de Passos Coelho esse grande partido liberal de direita? E terá sido por isso que ganhou as eleições com tamanha clareza? É mais fácil responder sim à primeira do que à segunda! Que existe o espaço ideológico para um grande partido liberal de direita, isso parece evidente. E isso, em si, já é uma novidade. Não podemos ter para sempre um país ideologicamente inclinado à esquerda e é salutar que do outro lado haja ideias política ideologicamente sustentadas. O PSD de Passos Coelho tem sido coerente e arrojado nas suas posições liberais. Resta saber se o velho PSD clientelar e apolítico está pelo ajustes, o que só poderemos confirmar quando acabar o estado de graça  (porque em “casa onde há pão, todos estão contentes e têm razão”). Mas terá sido por isso que o PSD ganhou? Isto está definitivamente por confirmar. O que eu acho, sinceramente, é que, uma vez mais como tantas vezes ao longo da sua história, o povo português foi maricas e meteu o rabinho entre as pernas. Votou massivamente na troika e não no PSD. Votou com medo e por medo e pediu encarecidamente aos senhores estrangeiros para tratarem dele. Para o porem na ordem. O que o povo português disse em 5 de Junho foi que nós não sabemos tratar de nós e é preciso que venham uns tipos do estrangeiro tomar conta do pedaço. E para isso escolheram aqueles que lhes pareciam mais perfiláveis para capatazes: Pedro Passos Coelho e Paulo Portas. Se sim ou não os portugueses quiseram experimentar uma ideologia liberal de direita e se sim ou não vão gostar do que ela vai trazer (se Passos Coelho a conseguir materializar em políticas…), isso é o que veremos nos próximos anos. Uma coisa é certa: parece quase paradoxal dizê-lo no quadro de dificuldades com que nos debatemos, mas esta pode ser a grande oportunidade liberal em Portugal!

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Pela sua inesperada violência, este é um Orçamento com duas margens:

1. Tem margem para um acordo de viabilização com o PSD, mediante abstenção em troca com uma ou duas concessões;

2. Tem margem para, em Maio, aliviar ligeiramente o torniquete (quando os mercados já estiverem mais “calmos”) e permitir ao PS voltar a ganhar as eleições.

É politicamente brilhante e coloca mais uma vez o PSD de Passos Coelho perante um dilema indesejável: ou vota contra e perde; ou viabiliza o orçamento… e perde! Mais uma vez, Sócrates dá “15 a 0” a Passos Coelho em política pura. O homem está para durar!

Sobre a “lei da rolha”

Sobre a “lei da rolha”, alguns considerandos antes da questão de substância.

1. Este congresso é a imagem de Santana Lopes. Primeiro, com a tenacidade e perspicácia que se lhe reconhece, Santana forçou um congresso para aquilo que o partido mais precisa: discutir o próprio partido. Começou sozinho, contra o PSD, e acabou por conquistar primeiro a opinião pública e depois, atrás dela, a opinião partidária. Mas, no final, como faz habitualmente, Santana borrou uma excelente pintura com a óbvia confusão entre ressentimentos pessoais e política partidária. Santana é um daqueles personagens que vive a política tão intensamente que se chega a convencer que a política faz parte da sua vida. Alguém lhe devia explicar que são duas coisas diferentes.

2. É impressionante que agora toda a gente seja contra a “lei da rolha”, mas na altura ninguém tenha levantado a voz contra ela. O que se terá passado? Estavam todos a dormir? Já ouvi reclamar da constitucionalidade da coisa, já ouvi ameaças de recurso para o conselho jurisdicional, mas ainda não ouvi ninguém que se tenha pronunciado contra no próprio congresso. Ou que tenha abandonado a sala nesse momento. Ou que tenha ameaçado sair do partido por causa disso. Se há coisa que o PSD sempre foi, é um partido de Liberdade. Está no seu ADN. Por isso, como alguém disse (PML, creio), esta “lei da rolha” é uma vergonha para o partido. Por muito menos já se rasgaram cartões de partido.

3. Mas nada disso vai à questão de substância: afinal, porque é que a maioria dos congressistas aprovaram a “lei da rolha”? É óbvia a psicologia que levou Santana a propô-la; é também evidente que a maioria dos notáveis estava demasiado entretida nos jogos florais eleitorais para perceber o que estava a acontecer; mas o que não é tão claro é porque razão o colectivo social-democrata se permitiu tamanha burrice. A explicação, parece-me, prende-se com a percepção de uma diferença fundamental entre o PSD e o PS.

Perante a quantidade de ferimentos políticos de que Sócrates já foi alvo, o facto de ter o partido unido atrás de si é notável e estabelece um contraponto óbvio em relação ao PSD. Para o bem e para o mal, nunca por nunca, no PSD, um líder com as fraquezas de Sócrates poderia subsistir sem críticas internas. E isso não é bom; é mau.

Um partido político não é uma representação da sociedade. O parlamento é que é uma representação da sociedade. Um partido é um exército político. Deve marchar em sintonia para ser vitorioso. E alimenta essa  unidade, primeiro que tudo, na mundivisão que resulta da sua ideologia de base, e, depois, na estratégia escolhida para a pôr em prática.

Ora, acontece que o PS é um partido mais sólido do ponto de vista ideológico do que o PSD. É mais fácil unificar as “tropas” no PS do que no PSD.  Aliás, em condições normais (e em Portugal), é mais unificador um projecto de esquerda do que um projecto de direita. O PSD é um partido de interesses. E os interesses não federam interesses. O que federa os interesses é a ideologia.

Por isso é que os congressistas sociais-democratas aprovaram a “lei da rolha”. Porque quiseram criar por decreto o que lhes falta como substrato. O PSD está cansado de correr atrás do PS com armas diferentes. Sente como um lastro as divergências internas de que não se consegue livrar. E olha para o lado, admirado, para um PS que parece imune às divergências. É esse sentimento profundo dos sociais-democratas que dá origem à “lei da rolha”. Mas é obviamente uma tontaria que o partido vai pagar caro.

Pedro Passos Coelho é o José Sócrates do PSD.

Há paralelos no seu percurso, nas suas circunstâncias e até na sua personalidade mediática que apontam a Passos Coelho o caminho de Sócrates trilhou.

Tanto Sócrates como Passos Coelho são produtos das juventudes partidárias, com um longo percurso dentro do partido mas sem qualquer brilhantismo fora dele.

Quando o poder caiu no colo de Sócrates sem que na realidade ele tivesse feito ou dito algo para o merecer, isso foi resultado da deserção de um Primeiro Ministro e das patetices de outro, com a “ajuda” de um Presidente com vontade de protagonismo. Agora, as circunstâncias são assustadoramente parecidas, com um PM politicamente morto, um Presidente com vontade de intervir e um partido a meditar se deve ou não substituir o cadáver por um pateta.

Por isso, o mais provável é que, mais cedo ou mais tarde, o poder caia no colo do PSD e – tudo o indica – de Pedro Passos Coelho. Quando chegar ao Governo (com maioria absoluta se tiver mesmo muita sorte ou com maioria relativa se tiver apenas alguma sorte), Passos Coelho vai fazer exactamente o que Sócrates fez: vai colocar em pontos-chave alguns amigos e muitos correligionários, nem uns nem outros muito recomendáveis. E, das duas uma: ou a inépcia dos amigos lhe estraga o “caldinho” ou a perseverança dos inimigos trata de desenterrar – com escutas ou sem elas – os “rabos de palha” que um longo carreirismo político necessariamente encerra.  E um dia diremos de Passos Coelho coisas parecidas às que hoje dizemos de Sócrates. Com mentiras ou outra coisa, com corrupção ou outra coisa, com carácter ou sem ele.

O país, entretanto, não ficará melhor.

Em declarações recentes a uma rádio, Ribeiro e Castro, deputado do CDS-PP, acusou o governo de ter uma “estratégia” louca que visa provocar eleições antecipadas na janela de oportunidade de Abril-Junho e aconselhou o Partido Socialista a mudar a liderança do Governo.

A primeira parte não é nova e tem sido repetida várias vezes pelos partidos da oposição e repetidamente pelo CDS-PP. Mas a segunda parte é que é realmente interessante e traz uma ideia nova para o debate.

Há duas linhas de pensamento  considerar quando olhamos para a situação política actual com a intenção de tentar perceber se Sócrates faz parte da solução ou faz parte do problema. A primeira tem a ver com a sua credibilidade, a segunda com a sua personalidade. E nenhuma das coisas é dispiscienda do ponto de vista político, como se verá.

Goste-se ou não do personagem, Sócrates tem sido o Primeiro-Ministro da nossa história democrática mais assolado por suspeições resultantes de processos judiciais ou ameaças de processos judiciais que eclodem à sua volta mas que nunca o chegam a atingir verdadeiramente. Na verdade, do ponto de vista formal, o Primeiro-Ministro está até hoje impoluto e tem todas as condições para governar. Mas, do ponto de vista político, é impensável negar que a sucessão de “casos” associados ao seu nome não afectem a sua margem de manobra política, em eleições ou fora delas. Os defensores de Sócrates há muito vêm dizendo que está em curso um campanha de assassinato de carácter para derrubar o Primeiro-Ministro e acusam a oposição, alguns media e opinadores, e até o Presidente, de “manobrarem” nesse sentido. Muitas vezes essa acusação é exagerada, mas muitas outras vezes, provavelmente ainda mais, não o é. E não custa a nenhum de nós apontar vários agentes (nos media e não só) cuja sistemática obsessão por Sócrates faz suspeitar de algo escondido. Os acusadores de Sócrates, naturalmente dizem que “não há fumo sem fogo” e que a repetição constante de “casos” (quase) envolvendo o Primeiro-Ministro são prova mais do que suficiente. Ou seja, existe suspeição de ambos os lados: se há, para alguns, matéria suficiente para suspeitar da honorabilidade de Sócrates, há, para outros, dados que justificam a suspeita de que estamos perante uma campanha de difamação pessoal inaceitável num estado democrático.  Tanto uma suspeição como outra fazem parte dos dados da situação política actual. Ou seja, devem ser levados em conta por quem analise a situação do ponto de vista estritamente político.

Não sabemos se esses dados foram tidos em conta nas reuniões internas nas quais o Partido Socialista escolheu o seu candidato a Primeiro-Ministro nas eleições legislativas. Pode parecer uma tolice pensar que o PS pudesse pensar em ter outro candidato a primeiro-ministro que não José Sócrates. Em primeiro lugar porque o PM devia defender a sua obra, em segundo porque não havia ninguém dentro do PS capaz de lhe disputar a liderança. Mas uma “vozinha” ou duas “vozinhas” que se tivessem levantado no interior do partido seriam úteis e dariam um sinal de que o partido não estava “morto” do ponto de vista da análise política. É aliás estranho que, ao longo de todos estes meses, com tantos “casos” politicamente “às costas”, Sócrates não tenha sido discutido sequer por uma só voz no interior do partido.

Por maioria de razão, o mesmo se pode dizer nos dias de hoje. Se a credibilidade de Sócrates já estava diminuída à partida para as eleições legislativas (e resta saber o quanto essa credibilidade diminuída é responsável pelos resultados eleitorais), agora, num quadro de maioria relativa, é a sua personalidade que salta também para o primeiro plano da actualidade política.  Claro que a personalidade de cada um é com cada um, mas, no plano político, ela é relevante somente na medida em que facilite ou dificulte o processo político. E é nesse sentido que as oposições têm levantado a questão: alegam que, em parte porque está habituado a governar em maioria, em parte porque tem pouca predisposição pessoal para dialogar e partilhar, José Sócrates não é capaz de governar em minoria. Aquilo que conhecemos de José Sócrates é aquilo que conhecemos de José Sócrates. Ou seja, podemos presumir que a pessoa José Sócrates não é capaz de diálogo, mas não o podemos saber com certeza.  O que significa que terá que ser  a realidade a prová-lo. O que, mais uma vez, aconselharia que alguma voz dentro do PS fosse capaz de levantar a questão, mesmo que apenas formulando-a sem a responder. Estará José Sócrates em condições de continuar a Governar? Terá ele, hoje, a margem de credibilidade e os traços de personalidade necessários para governar em minoria? Foi a porta para esta reflexão que a sugestão de Ribeiro e Castro discretamente abriu. Resta saber se alguém dentro do PS tem a coragem de a escancarar.

A situação política que vivemos actualmente é muito complexa. De diversos pontos de vista: pelo alinhamento estranho de forças no parlamento (minoria de um, maioria de esquerda a três, maioria de bloco central, maioria de direita contra o partido de governo, etc); pelo facto de haver eleições presidenciais a um ano de distância; por causa da janela de oportunidade de Abril-Junho; pelo facto de tanto o Presidente como o Primeiro-Ministro estarem diminuídos; por causa da urgência da crise económica e respectivas terapêuticas, etc. Por ser tão complexa, a situação política poderá ter várias formas de ser resolvida, todas elas com implicações políticas significativas: a demissão do Governo na janela de oportunidade de Abril-Junho, com convocação de novas eleições; o prolongar do actual “pântano” até 2011 na esperança de que seja eleito um presidente de esquerda “amigo” do PS; um governo de iniciativa governamental para dar estabilidade neste tempos difíceis; a “imposição” presidencial de um entendimento PS-PSD; etc. A ideia de substituição de José Sócrates por outro alto dirigente socialista mais preparado para governar nas novas circunstâncias políticas é apenas mais uma das muitas soluções possíveis ( e nem é das mais complexas do ponto de vista político). Basta que surja um oportuno convite internacional para qualquer coisa, o que até nem seria inédito…

Seria verdadeiro, mas simplista, dizer, em apoio desta solução, que o PS deve manter os interesses do país acima dos do partido. Mas na realidade a questão nem deve ser vista assim. O primeiro dever de um partido político é conquistar e manter o poder. Se o PS for capaz de fazer a reflexão sobre se Sócrates é parte da solução ou parte do problema, estará nesse mesmo momento a perguntar a si próprio se os interesses de Sócrates e do PS são hoje coincidentes; e quais deve preservar. Compete ao PS dar uma resposta. Mas para isso é preciso que alguém formule a pergunta.

Manuela Ferreira Leite e o problema da verdade

O PSD, como partido, está  hoje em dia mais ou menos na mesma situação que o Benfica, como clube de futebol. Aquilo de que mais precisa é que alguém tenha a coragem de dizer: “não podemos ganhar, primeiro temos que limpar a casa e isso ainda vai demorar uns aninhos”; mas acontece que as bases/adeptos não o aceitam. Por isso é que podem bem votar em Santana como votariam em Menezes ou no Palhaço. E é por isso que, mesmo que ganhe, Ferreira Leite vai levar um partido que não a quer.

Manuela Ferreira Leite tem espírito de missão e creio que já percebeu – como Pacheco Pereira -que o partido precisa que parar para reflectir no que pretende ser, mesmo que nesse processo corra o risco de se cindir. Por isso, a menos que a inépcia socialista seja tanta que lhe joge o poder no colo (como aconteceu com Sócrates), o PSD não vai ganhar em 2009 e vai arrastar-se pelo meio. Isto é o que ela sabe que tem que dizer ao partido. Mas também sabe que não é isto que o partido pretende ouvir. A história do “não-esperem-que-eu-mude-de-imagem-porque-eu-sou-como-sou” é apenas um epifenómeno deste finca-pé que Manuela Ferreira Leite sabe que tem que fazer para “dobrar” o partido. Terá mais ou menos condições para o conseguir consoante a votação que traga das directas Pedro Santana Lopes. Se vier fraco talvez se cale, se vier forte vai fazer-lhe a vida negra. E o partido está com ele.

Mais ainda que o PS, o PSD, nestes 34 anos de democracia, deixou-se  enredar na politiquice ao ponto de esquecer qual é a sua matriz política. Com a agravante de as matrizes políticas serem hoje uma coisa muito fora de moda. Por isso, precisa de se refundar. Precisa de se voltar para dentro e fazer uma reflexão profunda sobre qual o projecto político que pretende apresentar aos portugueses antes de poder aspirar a ganhar o poder.  No quadro da actual eleição, Passos Coelho é o único que apresenta uma proposta (vagamente liberal), Ferreira Leite sabe que a reflexão tem que ser feita, mas hesita em apontar um caminho (porque sabe que a sua voz “pesa” mais que a de Passos Coelho, o que impõe responsabilidade) e Santana, por ele, não mudava nada e caminhava alegremente para o abismo.

O que Manuela Ferreira Leite espera é ganhar o país para poder ganhar o partido. Apresenta-se com o sentido de Estado e aquela maneira “séria” de fazer política (um pouco asceta, mesmo) na esperança de que bons números nas sondagens lhe valham como trunfo junto dos militantes. Porque não há nada de que os militantes do PSD gostem mais do que do cheiro a poder. Com isso, Manuela Ferreira Leite espera ganhar o partido. E espera ganhá-lo com números (grandes os seus, pequenos os de Santana) que lhe permitam dizer: “meus amigos, hoje não vamos ganhar; hoje vamos reflectir”. Uma missão impossível, portanto. Pelo menos até prova em contrário…